sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Sou do povo, devo ser estúpido



A ASAE deu a conhecer hoje, através de um porta-voz, que não considera grave o facto de afinal existirem produtos de leite chinês à venda em Portugal. Assim como, por omissão, também faz tábua rasa de esses e outros produtos não estarem sequer identificados em língua portuguesa e fora da validade.
Em contraste com o fanatismo com que têm perseguido os nossos produtos de fabrico tradicional, para não falar noutros disparates, parece alinhar pela mesma bitola da sua congénere chinesa que também falhou redondamente na fiscalização dos grandes produtores de lacticínios.
Seria de esperar que, uma vez banidos do mercado chinês, esses produtos comecem a surgir noutros mercados numa tentativa dos produtores de o escoar a qualquer custo, mas a ASAE não parece preocupada.
Perante tudo isto, não posso deixar de ficar enjoado sempre que deparo com algumas pessoas que, perante uma situação como esta, adoptam um discurso do tipo: "isso não é bem assim", "a ASAE só está a fazer o seu trabalho", "o povo é que é estúpido", "os portugueses nunca estão satisfeitos".
Dá-me especialmente vómitos a parte em que se tentam colocar acima dos que designam como "povo" ou "as pessoas", como se fizessem parte de algum tipo de nobreza ou burguesia bem-pensante. Parecem julgar-se os guardiões do país que certamente estaria à deriva se não fosse governado por pessoas tão inteligentes como eles.
Julgando pela realidade, talvez fosse melhor que derivássemos um bocado do rumo que este tipo de pessoas nos está a impor.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Sem papas na língua



O Bastonário da Ordem dos Advogados afirmou ontem que é cada vez mais difícil cobrar dívidas através do tribunal, sendo mais fácil contratar gangsters. Afirmou ainda que hoje em dia se inventa tudo para não se fazer justiça nos tribunais.
Eu não poderia concordar mais. Quem já teve a experiência de ir a tribunal e observar o desfasamento entre as sentenças e a sua aplicação prática, terá de concordar também.
Não se respeitam os tribunais hoje em dia. As sentenças não são muitas vezes cumpridas e os tribunais lavam daí as suas mãos, ficando a justiça por aplicar.
Apesar de esta falta de respeito se dever muito a um sistema social e politico que tende a ser muito rígido com pequenas infracções e brando com as grandes, também se deve ao facto de se dar mais relevância a questões de forma e processuais do que a questões de facto. Os policias que o digam.
No entanto, a maior contribuição acaba por ser outro dos factores apontados por Marinho Pinto quando afirma que há juízes que preferem ser temidos que respeitados. Lembrando por exemplo alguns episódios no mundo da "justiça futebolística" onde muitos dos protagonistas são magistrados, parece-me difícil de facto que esta classe consiga manter o estatuto de respeito de que necessita.
O que acho mais lamentável no meio de tudo isto é que os órgãos representativos destes profissionais prefiram hostilizar quem tem coragem de dizer o que muitas pessoas pensam, em lugar de simplesmente reconhecer que no seu meio há bons e maus profissionais e que os bons estão a pagar pelos maus.

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Ao desconcerto do mundo



Ultimamente tem-me assaltado o pensamento este poema de Luís Vaz de Camões:

Os bons vi sempre passar
No Mundo graves tormentos;
E pera mais me espantar,
Os maus vi sempre nadar
Em mar de contentamentos.

Cuidando alcançar assim
O bem tão mal ordenado,
Fui mau, mas fui castigado.
Assim que, só pera mim,
Anda o Mundo concertado.